Orçado em cerca de R$ 870 milhões de reais, o Projeto Santa Quitéria, que prevê a mineração de urânio e fosfato no Município de Santa Quitéria (CE), coloca em risco direitos de toda a população cearense.
O empreendimento objetiva produzir 1.600 toneladas de concentrado de urânio e 1.050.000 toneladas de derivados fosfatados por ano. Esses materiais serão destinados à geração de energia nuclear e à produção de fertilizantes e ração animal para o agronegócio.
Proposto pelas empresas Indústrias Nucleares do Brasil e Galvani (que formam o Consórcio Santa Quitéria), o Projeto receberá financiamento público do Banco do Nordeste do Brasil. Contará, ainda, com R$ 85 milhões em investimentos do Governo Estadual para obras de infraestrutura e fornecimento de serviços. Entre estas, destacamos a pavimentação de cerca de 17km de estradas para escoamento da produção mineral e a construção de uma adutora de 54km no valor de R$ 60 milhões para oferta de água do Açude Edson Queiroz ao empreendimento.
Com a estimativa de uma vida útil de 20 anos, o Projeto envolverá a instalação de Complexo Nuclear (Unidade de Urânio); Complexo Mínero-Industrial (Unidade de Fosfato); pilha de estéril(depósito de resíduos da produção de concentrado de urânio que alcançará 90 metros de altura e terá 29.533.272 metros cúbicos de volume total); pilha de fosfogesso (depósito de resíduos da produção de ácido fosfórico que alcançará 70 metros de altura e terá 24.960.000 toneladas de material); barragem de rejeitos; sistemas de carga, descarga, transporte, transferência e estocagem; centrais de utilidades, insumos e sistemas auxiliares; sistemas de tratamento de água e fornecimento de energia elétrica e unidades administrativas e de apoio. Após seus 20 anos de vida útil, restarão milhões de toneladas de material radioativo provenientes das pilhas de estéril e fosfogesso e da barragem de rejeitos. Essas estruturas serão depósitos eternos de lixo tóxico na região.
Ao todo, 42 comunidades dos municípios de Santa Quitéria e Itatira poderão ser diretamente atingidas por esse Projeto. A maioria delas se constituem como assentamentos rurais e lutaram pelo acesso a terra em uma região ainda marcada pela concentração fundiária. Além das comunidades, as populações das sedes de Santa Quitéria e Itatira bem como dos municípios de Madalena, Canindé, Cariré, Catunda, Sobral e Fortaleza também estão em um circuito de risco devido aos impactos socioeconômicos e ambientais resultantes dos processos de produção, transporte e geração de resíduos da mineração e do beneficiamento de urânio e fosfato.
100% do concentrado de urânio produzido no empreendimento, por exemplo, será transportado, por via rodoviária, para o Porto do Mucuripe (em Fortaleza). Por ano, estão previstos 4 carregamentos (de 25 contêineres cada) que transportarão, no total,40 toneladas de material radioativo de Santa Quitéria para Fortaleza.
Em abril de 2014, o Consórcio entregou ao IBAMA, autarquia responsável pelo licenciamento ambiental do Projeto, o Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) referentes ao empreendimento. Iniciou-se, então, o prazo legal para a solicitação das audiências públicas necessárias à discussão do EIA-RIMA com as populações que podem ser atingidas.
A partir daí, a Associação de Moradores de Morrinhos (assentamento que fica a cerca de 4km da Mina), a Cáritas Diocesana de Sobral, o Diretório Central dos(as) Estudantes da Universidade Federal do Ceará (DCE-UFC) e 56 cidadãos(ãs) do Município de Fortaleza enviaram ofícios ao IBAMA denunciando que o EIA-RIMA do Projeto deveria ser refeito e solicitando que, depois da edição de um novo estudo e de um novo relatório, ocorressem audiências públicas nos municípios de Santa Quitéria, Itatira, Canindé, Madalena, Sobral, Fortaleza e nas comunidades de Morrinhos, Queimadas, Alegre-Tatajuba, Riacho das Pedras, Lagoa do Mato e Saco do Belém (as mais próximas à Mina). Os ofícios requisitaram também que, em cada um desses locais, ocorressem, pelo menos, cinco audiências públicas temáticas, tendo em vista a complexidade do tema e a dimensão de impactos que podem ser trazidos à população.
O IBAMA, todavia, negou os pedidos e agendou apenas três audiências. A primeira foi na última quinta, dia 20 de novembro, em Santa Quitéria; a segunda foi realizada nessa sexta, no dia 21, em Itatira, e a terceira, ontem (22), no Distrito de Lagoa do Mato. As empresas, por sua vez, informaram aos(às) representantes das comunidades que, nessas audiências, eles(as) terão apenas um minuto de fala para se expressarem.
Os momentos de manifestação, porém, foram além dos separados pelas empresas. Durante algumas apresentações, jovens mostraram resistências ao projeto de exploração, através de gritos e vaias. Apesar disso, a anulação do EIA não foi garantida: isso só ocorrerá a partir de um parecer negativo do IBAMA.
É para conseguir a anulação do EIA e o impedimento da instalação desse empreendimento no estado que o Núcleo TRAMAS, Trabalho, Meio Ambiente e Saúde, da Universidade Federal do Ceará, luta: focados na preservação e argumentando contra os riscos de contaminação, falta de segurança e impacto ambiental, o Núcleo tem se proposto a batalhar judicialmente contra o empreendimento.
Colaboração: Núcleo TRAMAS – UFC